Aplicar medidas antidumping em um cenário econômico global desafiador pode gerar distorções no mercado interno, premiando empresas que não estão competitivas e penalizando fabricantes e consumidores que hoje dependem de preços mais baixos de insumos para sobreviver.
Vale lembrar que o processo de investigação iniciou em 2023 uma época diametralmente oposta ao que acontece hoje no cenário econômico mundial. Portanto, é bom observar a mudança no cenário global e o fato de que hoje os preços internacionais estão pressionados por excesso de oferta e baixa demanda (efeitos da desaceleração econômica mundial). Isso leva a práticas comerciais de preços mais agressivos — nem sempre caracterizando dumping intencional, mas sim uma estratégia de sobrevivência em mercados saturados.
Risco de concentração de mercado e aumento de custos para a indústria nacional. Portanto, se uma medida antidumping é aplicada, ela pode favorecer um único player nacional, reduzindo a concorrência e elevando os preços para toda a cadeia (fabricantes de colchões, estofados, etc.). Isso impacta diretamente a competitividade de produtos brasileiros frente a importados acabados.
Sobrevivência da indústria downstream (colchões, espumas, estofados etc.). Estas empresas estão operando no limite de margem. Impor sobretaxas ao poliol pode ser o fator de estrangulamento final para muitos fabricantes. Em tempos de crise, manter o acesso a matérias-primas mais baratas pode ser a diferença entre continuar operando ou fechar.
Dumping "reverso": vender abaixo do custo para manter o mercado. Em tempos de crise, não é raro que até fornecedores nacionais vendam abaixo do custo para preservar market share. Logo, acusar um concorrente externo de dumping pode ser uma contradição com a própria prática do mercado local.
Impacto no consumidor final e inflação de produtos industriais. O aumento de custo na matéria-prima impacta o preço final de bens como colchões, sofás e até automóveis. Isso é fartamente demonstrado pela Abicol em relação ao impacto nos custos de colchões (veja abaixo).
Por tudo isso, diante da iminente conclusão da investigação do governo brasileiro sobre práticas de dumping na importação de poliol — insumo fundamental na produção de espumas flexíveis — é necessário considerar os impactos reais da aplicação de medidas antidumping em um contexto de desaceleração econômica global.
A imposição de taxas antidumping neste momento pode trazer os seguintes riscos:
- Premiar o ineficiente: ao proteger um player específico que não tem condições de atender plenamente o mercado interno, e não por práticas desleais externas.
- Aumentar o custo da cadeia produtiva: penalizando fabricantes de espumas e colchões que dependem de preços acessíveis para manter margens mínimas.
- Concentrar mercado e criar monopólio informal: reduzindo as opções de compra e enfraquecendo a negociação da indústria transformadora.
- Acelerar o fechamento de fábricas e perda de empregos: ao pressionar o custo de um setor que já opera com baixa rentabilidade.
- Gerar inflação para o consumidor final: sobretudo em produtos essenciais como colchões, estofados e artigos de conforto.
A defesa da indústria nacional passa por uma análise estratégica e responsável do papel das medidas de defesa comercial. O uso inadequado de tarifas antidumping em um momento de fragilidade econômica pode gerar mais danos que benefícios. É hora de olhar para o todo — e não apenas para o elo mais vocal da cadeia.
É o que a Móveis de Valor considera sobre as possíveis medidas antidumping para importações de poliol. E nos juntamos à Abicol em seus esforços em favor da indústria colchoeira nacional.
Ari Bruno Lorandi
CEO do Intelligence Group – Móveis de Valor e presidente do Instituto Impulso
Abaixo a exposição de motivos da Abicol para que o MDIC reavalie medida antidumping sobre poliol
O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), por meio da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), avalia a aplicação de medida antidumping sobre o poliol importado da China e dos Estados Unidos — principal insumo utilizado na produção de espumas flexíveis, base da fabricação de colchões, estofados e diversos outros bens industriais.
O poliol é um insumo estratégico, de uso imediato e sem substituto viável, representando até 55% da composição da espuma flexível e até 35% do custo final de um colchão. No Brasil, há apenas um produtor nacional, de capital estrangeiro, cuja capacidade de atendimento total à demanda interna não está comprovada, conforme reconhecido na própria Nota Técnica SEI nº 931/2025/MDIC.
A possível aplicação de direitos antidumping sobre o poliol importado resultaria em impactos imediatos e severos em toda a cadeia produtiva, afetando de forma desproporcional micro, pequenas e médias empresas e pressionando negativamente o emprego, a arrecadação e o acesso a bens essenciais.
Além da indústria colchoeira, a medida afetaria fortemente a indústria brasileira de estofados residenciais, automotivos e outros, que depende das espumas flexíveis para sua produção.
Riscos reais e efeitos práticos da medida
A indústria de colchões e espumas reúne mais de 300 fábricas e 150 mil empregos diretos e indiretos, além de sustentar uma rede produtiva essencial em todas as regiões do país. A imposição da medida antidumping causará:
- Aumento expressivo de custos: A aplicação da medida pode elevar em até 40% o custo da espuma e em até 35% o preço final dos colchões, além de gerar efeitos colaterais no custo dos móveis estofados.
- Risco de desabastecimento: A indústria nacional depende de um único fornecedor de poliol, sem garantia de capacidade plena de atendimento. A restrição às importações pode comprometer o abastecimento e estimular a especulação.
- Desindustrialização e evasão para o MERCOSUL: Diante da perda de competitividade no Brasil, empresas instaladas no Sul do país podem ser forçadas encerrar suas atividades e ou a transferir sua produção para outros países do MERCOSUL, onde continuariam tendo acesso ao poliol sem sobretaxa, garantindo sua sobrevivência econômica.
- Impacto nas compras públicas: Governos federal, estaduais e municipais adquirem cerca de 1,5 milhão de colchões por ano, destinados a programas sociais, unidades prisionais, abrigos e apoio emergencial. Com a medida antidumping do poliol, esses colchões poderão sofrer aumentos de até 40%, comprometendo a efetividade de políticas públicas de proteção social e resposta a desastres.
- Concorrência desleal: Países como China, Vietnã entre outros, barrados por medidas protetivas nos EUA e outros mercados, já têm excedentes industriais sendo redirecionados ao Brasil — onde não existe nenhuma medida de defesa comercial em vigor contra colchões importados. Isso agrava ainda mais a vulnerabilidade da indústria nacional.
- Prejuízo à geração de empregos e arrecadação: A cadeia produtiva de colchões e espumas mobiliza mais de 150 mil empregos diretos e indiretos em todo o país. A elevação dos custos e o risco de fechamento de fábricas podem agravar o desemprego regional, especialmente em áreas com menor desenvolvimento industrial.
O que a Abicol reivindica
- Sensibilizar o MDIC quanto à necessidade de não aplicação da medida antidumping sobre o poliol, dada sua essencialidade, ausência de substitutos e incompatibilidade com o interesse público.
Caso se opte pela aplicação da medida, que sejam exigidas: Modulação com prazo de transição adequado à realidade da cadeia produtiva;
Salvaguardas que assegurem o fornecimento contínuo e economicamente viável;
- Mecanismos para evitar a concentração da oferta em um único fornecedor e estimular a concorrência efetiva.